Recuperação das Economias Pós-Crise COVID19: Rumos Desejáveis

Nestes tempos de pandemia, com alguma frequência, nos deparamos com discussões sobre o formato da recuperação das economias após o período de necessário distanciamento social. Essas discussões perpassam, na maior parte das vezes, questões relativas à velocidade da recuperação: recuperação rápida, recuperação lenta com aceleração no médio prazo, recuperação lenta e de longo prazo, recuperação rápida com nova queda e nova recuperação rápida. Estas são traduzidas pelos seus formatos, respectivamente em V, em U, em L e em W. No entanto, pouco se discute sobre a qualidade deste processo de recuperação, o qual resultará, no longo prazo, em algum tipo de desenvolvimento para as sociedades. A questão que merece ser discutida é: Qual desenvolvimento queremos para nosso futuro pós-pandêmico? Para construir uma resposta, é necessário entender quais ideologias influenciam os governos no que tange à definição de políticas econômicas. Também é preciso compreender quais movimentos contemporâneos vêm conduzindo empresas e pessoas nas decisões de investimentos e consumo. Por fim, como utopia necessária, quais são as atuais articulações supranacionais que orientam a construção de um novo tipo de desenvolvimento, representadas aqui pelos objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU e pela Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Iniciando então pelos governos e a definição de suas políticas econômicas, é importante tratar do neoliberalismo. Ainda que com origens em meados do século XX, as tendências econômicas neoliberais para as práticas governamentais têm como marco inaugural a subida ao poder, na década de 1980, de Margaret Thatcher (1ª Ministra da Inglaterra) e Ronald Reagan (Presidente dos Estados Unidos da América). O governo de Thatcher representa a experiência neoliberal mais sistemática e ambiciosa dentre os países desenvolvidos. Esse governo adotou como principais medidas a contração da emissão monetária, elevação das taxas de juros, redução drástica dos impostos sobre os rendimentos mais altos, abolição dos controles sobre os fluxos financeiros, criação de níveis de desemprego massivos (para redução dos salários médios pagos e por esse meio o controle da inflação), repressão aos movimentos grevistas, novas legislações anti-sindicais e corte expressivo nos investimentos sociais. 

A partir dessas experiências, o neoliberalismo vem pautando políticas econômicas em todo o mundo, com graus diferentes de intensidade e com combinações diversas de medidas. De modo geral, contemporaneamente, as políticas econômicas estabelecidas com base nos preceitos neoliberais podem ser resumidas em redução da participação do Estado na economia, redução de regulação dos setores produtivo, financeiro e do mercado de trabalho, redução dos gastos sociais e intenso esforço para equilíbrio das contas públicas (austeridade fiscal). Essas políticas neoliberais resultaram  em mercados financeiros descorrelacionados dos setores produtivos, com aumento da periodicidade e intensidade das crises oriundas deste ambiente. Porém, as consequências mais nefastas do neoliberalismo foram uma intensificação da concentração de renda e riqueza dentro dos países, com achatamento dos salários médios acompanhado da precarização das relações trabalhistas, culminando no aumento da desigualdade social.   

Neste contexto, o crescimento econômico gerado no longo prazo, tende a beneficiar uma camada muito restrita da população. Além disso, cria situações que beneficiam os mercados financeiros, em detrimento das atividades produtivas. Em alguns países resulta em retrocessos no processo de desenvolvimento ampliando desigualdades e implicando numa emergência do autoritarismo que se julgava superado. Esta relação pode ser explicada nos seguintes termos: a perda de qualidade de vida e de perspectivas de emprego, renda, seguridade social, igualdade de acesso a oportunidades,  tende a ampliar a miséria e a marginalidade, implicando em maior sensação de insegurança da população.  Além disso, cria uma condição de concorrência entre camadas da população que receiam perder a condição de renda que possuem. Cresce a sensação de que a melhoria da qualidade de vida de uma camada da sociedade depende da perda de qualidade de vida de outras camadas da sociedade. Esta conjuntura amplia a insatisfação popular com o governo, com os partidos políticos e com as instituições nacionais de forma geral. Permite ainda a ampliação de atitudes conservadoras na população, muito focadas para a proteção dos "direitos históricos" e das "distinções de classe", abrindo espaço para discursos populistas de líderes carismáticos. Estes prometem o resgate da segurança, garantia dos direitos e retomada das condições econômicas perdidas. No entanto essas promessas são sistematicamente descumpridas, pois servem apenas para que estes governos se mantenham longamente no poder. 

Ao contrário do que se viu até primeira metade do século XX, essa ascensão de governos populistas, tanto à direita como à esquerda, não se deu por meio de golpes de Estado, mas numa perversão do processo democrático. No entanto, estes líderes, após eleitos, tendem a rejeitar as regras democráticas estabelecidas, negam continuamente a legitimidade de seus oponentes políticos, toleram a violência e até encorajam seu uso dentro das ações do Estado e dos seus seguidores e são propensos a restringir liberdades civis de oponentes (ao ponto da perseguição política e ideológica). Também atuam na censura à divulgação de informações, atacam a livre imprensa, negam dados científicos e trabalham contra a transparência necessária às ações do poder público. Nesta lógica, mesmo ascendendo ao poder através de voto popular, demonizam esta estrutura e usam o poder governamental para tentar eliminar os mecanismos de representação e de decisão democrática nacionais. Quando obtêm sucesso no projeto, promovem mudanças no arcabouço legal, apoderam-se do sistema judiciário e, em última instância, estabelecem-se como ditaduras. Esse processo é tão mais fácil quanto mais frágeis forem as instituições democráticas estabelecidas dentro do território nacional.

Retomando a narrativa histórica, é preciso resgatar ainda que  o período de 1980 a 2010  encontra-se marcado por sucessivas crises originadas pela instabilidade do sistema financeiro: 

  • A Black Monday em 1987, onde em apenas um dia o índice Dow Jones despencou 22,6%, arrastando quedas pelo mundo todo - deixando evidente como os mercados financeiros globais estavam (são) intrinsecamente ligados, e como estavam (são) vulneráveis;
  • A Crise do Peso Mexicano em 1994, quando o governo Mexicano desistiu de tentar manter um câmbio fixo em relação ao dólar. A desvalorização repentina do peso gerou uma crise de confiança sem precedentes, gerando um aumento de 60% no desemprego daquele país. A crise transbordou por toda América Latina, gerando o que ficou conhecido como Efeito Tequila;
  • Em 1997 foi a vez da Crise dos Tigres Asiáticos, iniciada por uma mega desvalorização da moeda Tailandesa. A queda atingiu em seguida Filipinas, Malásia e Indonésia, para depois repercutirem em Taiwan, Hong Kong e Coreia do Sul, mostrando mais uma vez como a fragilidade do mercado se espalha rapidamente. O Fundo Monetário Internacional precisou intervir para resgatar as economias mais atingidas;
  • Em 1998 o sistema bancário da Rússia entrou em colapso, sendo que o país decretou uma suspensão de pagamentos internacionais (“default” em economês, vulgo calote), bem como desvalorizou o rublo e congelou depósitos em moedas estrangeiras. O evento ficou conhecido como “Crise do Rublo”. O FMI precisou conceder créditos multimilionários para evitar uma quebradeira generalizada no mercado internacional;
  • Com consequência da Crise do Rublo, um fundo americano especializado em operações alavancadas com derivativos, o Long Term Capital Management (LTCM) sofreu perdas consideráveis, acima de 4 bilhões de dólares. Até aí nada demais. Porém como as operações eram altamente alavancadas, e tinham como garantidores diversas instituições financeiras mundiais, o FED (Federal Reserve - banco central americano), teve que engendrar um resgate (bailout) da ordem de 4,6 bilhões para que o sistema financeiro americano (e mundial) não colapsasse no rastro do LTCM.
  • Já no ano 2000 aconteceu o estouro da “Bolha das .com”.  Com o advento da internet, nos anos que precederam a virada do milênio houve uma euforia generalizada com todo e qualquer negócio que anunciasse sua entrada na internet (normalmente “algumacoisa.com” - daí o nome da crise). Essa crise derrubou o índice Nasdaq e levou ao fechamento de cerca de 5 mil empresas, incluindo algumas empresas tradicionais de telecomunicações, envolvidas em diversos escândalos contábeis.
  • Nossos hermanos Argentinos também tiveram uma crise com repercussões mundiais para chamar de sua. Durante algum tempo tentaram dolarizar a economia interna através de uma paridade fixa com o dólar americano. Quando começou a ocorrer uma fuga de capitais, o governo impôs restrições à saques (uma vez que não possuía fundos para manter a paridade). Essas restrições ficaram conhecidas como “Corralito”. Em 2001 a Argentina suspendeu o pagamento de sua dívida externa.
  • Uma das maiores crises, senão a maior do período, no entanto, originou-se na maior nação capitalista do planeta. Em 2009 os EUA sofreram seu maior impacto financeiro desde a crise de 1930. O evento que deu origem à crise foi o estouro da bolha imobiliária, mas a crise em si foi tão profunda que ficou conhecida como “A Grande Recessão”. Até meados de 2008 hipotecas eram fornecidas a compradores sem um histórico sólido de crédito - e essa abundância de capital estimulou o mercado imobiliário por anos, inflacionando os preços dos imóveis. Entretanto, os emissores da hipoteca (bancos, por exemplo), não ficavam com as dívidas. Eles as empacotavam em instrumentos derivativos, juntamente com hipotecas mais seguras, e vendiam esses pacotes (collateralized debt obligations -  CDO) no mercado. Em um dado momento os compradores dos imóveis começaram a ter dificuldades em honrar as prestações das hipotecas e simplesmente deram default. Como um castelo de cartas, todo sistema financeiro começou a desabar. O governo americano precisou criar um programa de resgate financeiro da ordem de 1,5 trilhões de dólares (entre os governos Bush filho e Obama) para primeiramente salvar o sistema bancário americano, e em seguida para tentar estimular a economia e sair da recessão.
  • Como crise pouca é bobagem, entre 2009 e 2010 houve a “Crise da Dívida na Europa.  Grécia em maior grau, mas também Irlanda, Portugal, Itália e Espanha precisaram ser socorridas pela União Europeia e pelo FMI para evitar o calote de suas dívidas, devido ao seu alto déficit e seu quadro recessivo. Essa crise mais uma vez gerou desconfiança sobre a sanidade financeira da Zona Euro e teve reflexos nos demais continentes. 

Essas crises, cada vez mais frequentes e mais intensas,  não ocasionam apenas perdas financeiras para alguns. Por exemplo, a Crise Mexicana gerou desemprego em massa, a Crise Argentina criou desabastecimento e desemprego, a Grande Recessão americana fez com que milhares de pessoas fossem expulsas de suas casas e tivessem que morar na rua. Crises financeiras fazem vítimas também nas camadas mais pobres das populações, afetando a subsistência de seres humanos. A maior nação capitalista do planeta, os EUA, que por acaso também o país mais rico do mundo, possui 12% de sua população - ou 40 milhões de seres humanos - vivendo abaixo da linha da pobreza . Esses exemplos são sintomas evidentes e dolorosos de um sistema doente, que precisa ser modificado, tornado são, caso contrário não sobreviverá a si mesmo.

Além do lado financeiro das crises, nesse mesmo período houve agravamento de movimentos migratórios de pessoas que buscam fugir da fome, da miséria e da violência, da falta de estrutura, da guerra (como Irã-Iraque nos anos 80, Israel-Palestina, 1ª guerra do golfo, 2ª guerra do golfo, Afeganistão, Primavera Árabe, Sudão entre outros conflitos no continente africano) e das perseguições étnicas e religiosas. De acordo com a ONU, em 2017 o número de migrantes chegou a 258 milhões de pessoas. Também nesse ínterim constata-se a ampliação das distâncias entre os mais ricos e os mais pobres ocasionada pela acumulação de rendas e de  riquezas (como demonstram os estudos de Stiglitz e de Piketty). 

Passando a abordar os movimentos contemporâneos que vêm conduzindo empresas e pessoas nas decisões de investimentos e consumo, iniciamos destacando que também neste período aprofunda-se o conhecimento sobre os impactos ambientais das atividades humanas e sobre os impactos sociais e econômicos da mudança climática. A devastação ambiental compromete severamente a capacidade das populações inseridas nos ecossistemas de atenderem suas necessidades de alimento e moradia. Isso ocorre porque estas populações desenvolveram relações simbióticas com o meio ambiente natural e precisam dele para coletar e caçar seu alimento, bem como para prover os insumos necessários à construção de seu abrigo. Em troca, manejam o ambiente de forma a contribuir com sua preservação (essa é a realidade das populações indígenas brasileiras e de vários povos africanos, por exemplo). Por outro lado, a mudança climática ocasionada pela emissão de gases de efeito estufa (dióxido de carbono e metano, para citar os mais conhecidos), a partir dos processos produtivos humanos, têm impactos sobre os equilíbrios ecológicos e serviços ecossistêmicos. Os efeitos já percebidos destas mudanças traduzem-se em alteração dos regimes de chuvas, aumento da intensidade de tempestades, aumento do nível do mar, alteração de períodos de germinação de determinadas plantas e de nascimento de alguns animais, expansão da taxa de extinção de seres vivos. Estas mudanças afetam as populações mais dependentes do meio ambiente natural, mas também impactam populações nos ambientes urbanos e rurais. Geralmente as populações mais atingidas por estas mudanças são aquelas que têm menores recursos disponíveis para contrapô-las, sejam estes recursos monetários ou tecnológicos. 

Todas estas questões têm implicações importantes para os processos decisórios dos governos, das empresas e dos indivíduos. A tomada de consciência sobre as fragilidades sociais e ambientais e suas relações com as crises econômicas, sanitárias e humanitárias tem feito com que um conjunto importante de organizações adotem medidas voltadas para sustentabilidade. Empresas do setor produtivo, sejam da indústria, serviços ou do agronegócio vêm mudando seus critérios de investimento e produção para incluir como principais determinantes as questões sócio ambientais. Inclusive empresas do setor financeiro, sejam grandes bancos ou importantes fundos de investimento, têm adotado políticas cada vez mais claras e incisivas para melhorar a sustentabilidade ambiental, social e de governança dos negócios.  Esses aspectos são internacionalmente chamados de ESG - Environment, Social and Governance. Grandes fundos de investimento sejam fundos soberanos (como o da Noruega) ou privados (segundo o banco Morgan Stanley, já existem 10723 fundos ESG - aqui no Brasil o primeiro foi lançado há pouco tempo, o ESGB11) ou mesmo uma grande gestora de recursos como a Black Rock (que administra US$ 7,2 trilhões) têm usado a observação de aspectos ESG como o determinante de seus investimentos financeiros ou produtivos. Ou seja, países ou empresas que não observarem a preservação do meio ambiente, princípios de proteção social e busca por equidade e justiça, além de critérios éticos e de transparência em sua gestão financeira, tendem a ficar alheios a um grande potencial de recursos disponíveis para alavancar a retomada do crescimento econômico pós pandemia. 

A questão ambiental tem influenciado também o comportamento do consumidor. Esse comportamento transparece nas preocupações com a qualidade dos produtos (orgânicos, oriundos de fontes renováveis, recicláveis, reciclados, etc.), mas também nas preocupações com a quantidade consumida, sinalizando possíveis reduções de consumo. Grande parte das discussões e movimentos neste sentido visam o redimensionamento do consumo na existência do indivíduo, buscando dar novo significado ao seu papel, no sentido de atendimento de necessidades e não de conquista do ser pelo ter. Ou seja, no mundo contemporâneo somos entendidos como consumidores - este é o papel definido para nós. Mas será que é esse mesmo o papel que queremos ter dentro da sociedade? Não somos  pessoas com direitos e deveres individuais antes? Ser cidadão não deveria ser uma prioridade antes de sermos consumidores? Ser trabalhador não é mais importante, e até antecedente, ao ser consumidor? Consumo sustentável e minimalismo são abordagens que emergem neste contexto e que se contrapõem ao consumismo e acumulações típicos das economias capitalistas. A parada que a pandemia causa na vida diária contribui para que mais pessoas pensem sobre seus hábitos de consumo e sobre o papel que o consumo tem em suas vidas. Pode surgir deste momento uma tendência mais ampla nos hábitos de consumo e que pode convergir para comportamentos mais conscientes. 

Neste contexto, se por um lado a atual tríplice crise - sanitária, social e econômica -  é danosa ao tecido social, e causa a necessidade de ajustes drásticos das políticas públicas;  por outro lado cria uma oportunidade de mudança - individual e coletiva. Mas uma mudança para onde? Quais referências podem ser usadas para ajudar nos processos de tomada de decisão de governos, empresas e pessoas no sentido de recuperar  sociedades e economias? Qual o desenvolvimento que queremos? 

Na procura por estas referências, não podemos desconsiderar o poder de esclarecimento advindo dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, propostos pela ONU (Organização das Nações Unidas) para o mundo. Estes objetivos são a versão mais recente de um grande esforço da ONU, através do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), para discutir o fenômeno desenvolvimento e contribuir para a concretização da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Este esforço vem sendo feito especialmente no que toca à erradicação da pobreza, o acesso irrestrito à educação, cultura, moradia e saneamento distribuição de riqueza, melhoria da qualidade de vida, conquista da justiça social, redução da desigualdade de oportunidades e preservação do meio ambiente natural, de tal forma que estas passem a ser condições imprescindíveis para que um país seja considerado uma nação desenvolvida. 

São Objetivos do Desenvolvimento Sustentável:

  1. Erradicação da pobreza: acabar com a pobreza em todas as suas formas, em todos os lugares;
  2. Fome zero e agricultura sustentável: acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar e melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável;
  3. Saúde e bem-estar: assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos, em todas as idades;
  4. Educação de qualidade: assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todas e todos;
  5. Igualdade de gênero: alcançar a igualdade de gênero e empoderar todas as mulheres e meninas;
  6. Água potável e saneamento: assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todas e todos;
  7. Energia limpa e acessível: assegurar o acesso confiável, sustentável, moderno e a preço acessível à energia para todas e todos;
  8. Trabalho decente e crescimento econômico: promover o crescimento econômico sustentado, inclusivo e sustentável, emprego pleno e produtivo e trabalho decente para todas e todos;
  9. Indústria, inovação e infraestrutura: construir infraestruturas resilientes, promover a industrialização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação;
  10. Redução das desigualdades: reduzir a desigualdade dentro dos países e entre eles;
  11. Cidades e comunidades sustentáveis: tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis;
  12. Consumo e produção responsáveis: assegurar padrões de produção e de consumo sustentáveis;
  13. Ação contra a mudança global do clima: tomar medidas urgentes para combater a mudança climática e seus impactos;
  14. Vida na água: conservação e uso sustentável dos oceanos, dos mares e dos recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável;
  15. Vida terrestre: proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres, gerir de forma sustentável as florestas, combater a desertificação, deter e reverter a degradação da terra e deter a perda de biodiversidade;
  16. Paz, justiça e instituições eficazes: promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis;
  17. Parcerias e meios de implementação: fortalecer os meios de implementação e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável.

Para além de um desejo, é possível dizer que movimentos no sentido destes objetivos já vêm sendo feitos por empresas, pessoas e governos. Decisões sobre investimento, consumo e nossa escolha por  governos comprometidos com esta pauta são indicativos fortes de uma ação consciente por um caminho econômico, social e ambientalmente mais gentil. Um mundo orientado por estes objetivos e pelos direitos que constam na Declaração Universal dos Direitos Humanos é certamente melhor, mais próspero, mais sustentável e sustentado e capaz de gerar condições para que as pessoas alcancem seu melhor potencial pessoal e produtivo. Um mundo construído nestas bases com certeza seria um lugar de pessoas mais felizes e realizadas, de menos conflito, de menos violência, de menos guerras. 

A retomada do desenvolvimento através destes princípios tem o potencial de tornar as economias mais prósperas e as sociedades mais justas. Pode soar utópico, e talvez o seja. Não como um sonho idealizado e irrealizável, mas no sentido proposto pelo diretor de cinema argentino Fernando Birri  quando foi questionado “Para quê serve a utopia?”: 

“A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que  não deixemos de caminhar”. 

Este é um mundo em que gostaríamos de viver,  e que, queremos crer, estamos trabalhando para deixar para nossos filhos e netos, nossos estudantes e seus descendentes. Para ajudar nesta utopia, nos despedimos com um poema do Eduardo Galeano, chamado de “El Derecho al Delirio” :


O direito de sonhar 

~Eduardo Galeano

Que tal se delirarmos por um tempinho

Que tal fixarmos nossos olhos mais além da infâmia

Para imaginar outro mundo possível?


O ar estará mais limpo de todo o veneno que

Não provenha dos medos humanos e das humanas paixões.


Nas ruas, os carros serão esmagados pelos cães.

As pessoas não serão dirigidas pelos carros

Nem serão programadas pelo computador.

Nem serão compradas pelos supermercados

Nem serão assistidas pela TV,

A TV deixará de ser o membro mais importante da família,

Será tratada como um ferro de passar roupa

Ou uma máquina de lavar.


Será incorporado aos códigos penais

O crime da estupidez para aqueles que a cometem

Por viver só para ter o que ganhar

Ao invés de viver simplesmente

Como canta o pássaro em saber que canta

E como brinca a criança sem saber que brinca.


Em nenhum país serão presos os jovens

Que se recusem ao serviço militar

Senão aqueles que queiram servi-lo.

Ninguém viverá para trabalhar.

Mas todos trabalharemos para viver.


Os economistas não chamarão mais

De nível de vida o nível de consumo

E nem chamarão a qualidade de vida

A quantidade de coisas.


Os cozinheiros não mais acreditarão

que as lagostas gostam de ser fervidas vivas.

Os historiadores não acreditarão que os países adoram ser invadidos.

Os políticos não acreditarão que os pobres

Se encantam em comer promessas.


A solenidade deixará de acreditar que é uma virtude,

E ninguém, ninguém levará a sério alguém que não seja capaz de rir de si mesmo.


A morte e o dinheiro perderão seus mágicos poderes

E nem por falecimento e nem por fortuna

Se tornará o canalha em virtuoso cavalheiro.


A comida não será uma mercadoria

Nem a comunicação um negócio

Porque a comida e a comunicação são direitos humanos.

Ninguém morrerá de fome

Porque ninguém morrerá de indigestão.


As crianças de rua não serão tratadas como se fossem lixo

Porque não existirão crianças de rua.

As crianças ricas não serão como se fossem dinheiro

Porque não haverá crianças ricas.


A educação não será privilégio daqueles que podem pagá-la

E a polícia não será a maldição daqueles que podem comprá-la


A justiça e a liberdade, irmãs siamesas

Condenadas a viver separadas

Voltarão a juntar-se, bem agarradinhas,

Costas com costas.


Na Argentina, as loucas da Plaza de Mayo

Serão um exemplo de saúde mental

Porque elas se negaram a esquecer

Os tempos da amnésia obrigatória.


A Santa Madre Igreja corrigirá

Algumas erratas das Taboas de Moisés,

E o sexto mandamento mandará festejar o corpo.

A Igreja ditará outro mandamento que Deus havia esquecido:

“Amarás a natureza, da qual fazes parte”


Serão reflorestados os desertos do mundo

E os desertos da alma

Os desesperados serão esperados

E os perdidos serão encontrados

Porque eles são os que se desesperaram por muito esperar

E eles se perderam por tanto buscar.


Seremos compatriotas e contemporâneos

De todos o que tenham

A vontade de beleza e vontade de justiça

Tenham nascido quando tenham nascido

Tenham vivido onde tenham vivido

Sem importarem nem um pouquinho

As fronteiras do mapa e do tempo.


Seremos imperfeitos

Porque a perfeição continuará sendo o aborrecido privilégios dos deuses

Mas neste mundo, trapalhão e fodido,

Seremos capazes

De viver cada dia como se fosse o primeiro


Autoria

Daniel Gomes Mesquita

Debora Nayar Hoff  



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